quarta-feira, 24 de novembro de 2010

"A BÊNÇÃO DO ESTÍMULO"

"Comentavam os aprendizes que a verdade constitui dever primordial, acima de todas as
obrigações comuns, quando Filipe afiançou que, a pretexto de cultuar-se a realidade, ninguém
deveria aniquilar a consolação. E talvez por reportar-se André à franqueza com que o Mestre
atendia aos mais variados problemas da vida, o Senhor tomou a palavra e contou, atencioso:
— Devotado chefe de família que lutava com bravura por amealhar recursos com que
pudesse sustentar o barco doméstico, depois de desfrutar vasto período de fartura, viu-se pobre
e abandonado pelos melhores amigos, de uma semana para outra, em virtude de enorme
desastre comercial. O infeliz não soube suportar o golpe que o mundo lhe vibrava no espírito e
morreu, após alguns dias, ralado por inomináveis dissabores.
Entregue a si mesma, ao pé de seis filhos jovens, a valorosa viúva enxugou o pranto e
reuniu os rebentos, ao redor de velha mesa que lhes restava, e verificou que os moços amargurados
pareciam absolutamente vencidos pela tristeza e pelo desânimo.
Cercada de tantas lamentações e lágrimas, a senhora meditou, meditou... e, em seguida,
dirigiu-se ao interior, de onde voltou sobraçando pequena caixa de madeira, cuidadosamente
cerrada, e falou aos rapazes com segurança:
— “Meus filhos, não nos achamos em tamanha miserabilidade. Neste cofre possuímos
valioso tesouro que a previdência paternal lhes deixou. É fortuna capaz de fazer a nossa felicidade
geral; entretanto, os maiores depósitos do mundo desaparecem quando não se alimentam
nas fontes do trabalho honesto e produtivo. Em verdade, o nosso ausente, quando desceu ao
repouso, nos empenhou em dívidas pesadas; todavia, não será justo o esforço pelas resgatar
com a preservação de nosso precioso legado? Aproveitemos o tempo, melhorando a própria
sorte e, se concordam comigo, abriremos a caixa, mais tarde, a menos que as exigências do
pão se façam insuperáveis.”
Belo sorriso de alegria e reconforto apareceu no semblante de todos.
Ninguém discordou da sugestão materna.
No dia seguinte, os seis jovens atacaram corajosamente o serviço da terra. Valendo-se de
grande gleba alugada, plantaram o trigo, com imenso desvelo, em valoroso trabalho de colaboração
e, com tanto devotamento se portaram que, findos seis anos, os débitos da família se
achavam liquidados, enorme propriedade rural fora adquirida e o nome do pai coroado, de
novo, pela honra justa e pela fortuna próspera.
Quando já haviam superado de muito os bens perdidos pelo pai, reuniram-se, certa noite,
com a genitora, a fim de conhecerem o legado intacto.
A velhinha trouxe o cofre, com inexcedível carinho, sorriu satisfeita e abriu-o sem grande
esforço. Com assombro dos filhos, porém, dentro do estojo encontraram somente velho pergaminho
com as belas palavras de Salomão:
— “O filho sábio alegra seu pai, mas o filho insensato é a tristeza de sua mãe. Os tesouros
da impiedade de nada aproveitam; contudo, a justiça livra-nos da morte no mal. O Senhor
não deixa com fome a alma do justo; entretanto, recusa a fazenda dos ímpios. Aquele que trabalha
com mão enganosa, empobrece; todavia, a mão dos diligentes enriquece para sempre”.
Entreolharam-se os rapazes com júbilo indizível e agradeceram a inolvidável lição que o
carinho materno lhes havia doado.
Silenciou o Mestre, sob a expressão de contentamento e curiosidade dos discípulos e,
finda a ligeira pausa, terminou, sentencioso:
— Quem classificaria de enganadora e mentirosa essa grande mulher? Seja o nosso falar
“sim, sim” e “não, não” nos lances graves da vida, mas nunca espezinhemos a bênção do estímulo nas lutas edificantes de cada dia. O grelo tenro é a promessa do fruto. A pretexto de acender
a luz da verdade, que ninguém destrua a candeia da esperança."

("Jesus no Lar", Neio Lúcio/Francisco Cândido Xavier)

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