"Ainda existe, em maior escala do que se
pensa, o medo do Espiritismo. Há pouco, fomos procurados por uma pessoa
que, sentindo evidentes perturbações de origem mediúnica, e tendo
percorrido os consultórios de psiquiatria, vira-se obrigada a recorrer
aos "recursos espirituais", segundo dizia. Quando soube que não estava
tratando com um "espiritualista", mas com um espírita, assustou-se de
tal maneira, que viu-se forçada a confessar o seu medo. "Se eu soubesse
que o senhor era espírita — declarou — não o teria procurado." A verdade
é que, apesar disso, acabou se convencendo de que o Espiritismo poderia
ajudá-la, e mais tarde tornou-se espírita. Mas não foi muito fácil
arrancar-lhe da mente o pavor doentio que lhe haviam infundido.
Sacerdotes, pessoas da família, amigos e médicos, todos haviam
contribuído para que o medo se enraizasse em sua alma. Terrível medo,
que a desviava da única solução possível para o seu problema. E o que é
mais curioso, a maior contribuição para esse estado de temor foi dado
por certas publicações espiritualistas, que apesar de admitirem a
reencarnação e a lei de causa-e-efeito, condenam a mediunidade,
pintando-a com as mais negras pinceladas.
O preconceito anti-espírita assemelha-se
muito à prevenção contra o Cristianismo, no mundo antigo. As pessoas que
temem o Espiritismo não conhecem a doutrina, dão ao termo aplicações
indevidas, perdem-se num cipoal de lendas e suposições a respeito das
sessões espíritas. Em geral nos acusam de endemoniados, necromantes,
feiticeiros e coisas do mesmo teor, como faziam gregos e romanos com os
cristãos primitivos. E essas deturpações do Espiritismo não são apenas
orais, correndo entre pessoas simples. Figuram também em publicações
eruditas, revistas, jornais, livros de ensaios e estudos, com
signatários cultos.
Pitágoras já dizia que a Terra é a morada
da opinião. E como a opinião é a coisa mais frívola que existe, a mais
incerta e a mais irresponsável, não é de admirar que tanta gente opine
sobre o que não conhece. Mesmo entre os letrados, a opinião é um hábito
enraizado. Mas é evidente que, quando se trata de uma doutrina
espiritual, esposada por tantos homens de projeção no mundo das ciências
e do pensamento, em todo o mundo, as pessoas de cultura, ou mesmo de
mediana cultura, deviam ter mais cautela ao se manifestarem a respeito.
Porque se é livre o direito de opinar, não é menos livre o direito de se
julgar o senso de responsabilidade de quem opina.
O maior motivo de temer do Espiritismo é o
próprio temor. Ou seja: é a covardia humana, essa terrível covardia que
faz os homens estremecerem de horror diante do perigo de mudarem de
posição diante da vida e do mundo. O Espiritismo, entretanto, não exige
outra mudança, senão a da concepção estreita de uma vida utilitarista e
falsa, para a ampla concepção de uma vida espiritual, profunda e
verdadeira. Quanto ao problema das relações com o mundo invisível, o
Espiritismo não estabelece essas ligações, que existem na vida de todas
as criaturas, mas apenas as explica e orienta, dando-lhes o verdadeiro
sentido no processo da existência: Temer o Espiritismo é temer a
verdade, que os seus princípios nos revelam, apesar de todos os que
lutam para deturpá-los."
"O Homem Novo", José Herculano Pires
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